17.10.05

Onde a poesia se exibe como um espectáculo espectacular
não é poesia
onde a audácia do poema não é única
não é poesia
onde a poesia não é inocência de natureza fluvial
não é poesia
onde a poesia não é escandalosamente pura
não é poesia
onde a poesia não é filha do deserto nem da sede
não é poesia
onde a poesia não é presença viva que nasce da solidão e da ausência
não é poesia
onde a poesia não se oferece no seu abandono
não é poesia
onde a poesia não é poesia
não é poesia

António Ramos Rosa

António Ramos Rosa nasceu em Faro, a 17 de Outubro de 1924, e aí viveu durante a juventude, tendo-se radicado definitivamente em Lisboa, em 1962, depois de duas breves estadas na capital, nos anos 40 e 50, durante as quais teve uma experiência gorada como empregado de escritório, de que é testemunho o conhecido Poema Dum Funcionário Cansado. Para além das muitas obras que foi publicando, a sua intensa actividade poética, crítica e ensaística foi-se disseminando, ao longo de toda a segunda metade do século XX, em projectos editoriais como as revistas de poesia Árvore, Cassiopeia e Cadernos do Meio-Dia (de que foi co-director), bem como em diversos jornais e revistas, de que se destacam, entre outros, os suplementos literários do Diário de Notícias e d’ A Capital, o Jornal de Letras e a Colóquio/Letras. Proposto para o Prémio Nobel em várias ocasiões, a sua personalidade e obra têm merecido não só a consideração dos seus pares, como a distinção de prémios literários nacionais e internacionais. Como poeta, estreou-se na colectânea O Grito Claro (1958). Também tradutor, escreveu dezenas de volumes de poesia. No que respeita ao ensaio, Ramos Rosa é autor, entre outras, da obra Poesia, Liberdade Livre (1962). (a partir de Ana Paula Coutinho Mendes, António Ramos Rosa – Antologia Poética, Círculo de Leitores, Fevereiro de 2001)