20.2.06

DE TARDE

Naquele pic-nic de burguesas,
Houve uma coisa simplesmente bela,
E que, sem ter história nem grandezas,
Em todo o caso dava uma aguarela.

Foi quando tu, descendo do burrico,
Foste colher, sem imposturas tolas,
A um granzoal azul de grão-de-bico
Um ramalhete rubro de papoulas.

Pouco depois, em cima duns penhascos,
Nós acampámos, inda o Sol se via;
E houve talhadas de melão, damascos,
E pão-de-ló molhado em malvasia.

Mas, todo púrpuro a sair da renda
Dos teus dois seios como duas rolas,
Era supremo encanto da merenda
O ramalhete rubro de papoulas!

Cesário Verde
Cesário Verde nasceu no dia 25 de Fevereiro de 1855 na cidade de Lisboa. Dos seus estudos sabe-se apenas que em 1865 concluiu a instrução primária e que frequentou o Curso Superior de Letras (três ou quatro meses, apenas) no ano lectivo de 1873-1874. No entanto, ao iniciar-se na vida prática aos 16 para 17 anos, o futuro ferrageiro/lavrador já devia ter outras ambições que não apenas comerciais. Não se lhe conhecem poemas ou outra literatura desse tempo nem anterior. O facto é que em 1873 começou a escrever poesia e decidiu matricular-se no Curso Superior de Letras. Não teve, porém, êxito nos estudos; mesmo assim, o seu principal objectivo - que era, ao fim e ao cabo, penetrar no meio literário - foi atingido através do conhecimento travado nas aulas com o jornalista Silva Pinto, pela mão de quem passou a frequentar a boémia do Café Martinho. Porém, Cesário também não teria êxito na vida literária. Alguns amigos reconheceram-lhe talento, mas não faltou quem abominasse os seus versos prosaicos, exacerbadamente realistas. Em 1885 acentuava-se a debilidade do seu estado e no ano seguinte, pelo começo de Março, iria adoecer gravemente dos pulmões. Na semana seguinte à sua morte, ocorrida no dia 19 de Julho de 1886, Silva Pinto fazia saber pela imprensa o seu propósito de tomar para si a honra de ser o editor do poeta. Um mês depois já tinha todos os poemas que entrariam no Livro de Cesário Verde e em Abril do ano seguinte fazia sair do prelo, impresso pela Elzeviriana, de Lisboa, e publicado a expensas de Silva Pinto O Livro com aquele título. »

2 Comments:

At 7:35 da tarde, Anonymous Anónimo said...

O Silva Pinto esteve para o Cesário como a Ana de Castro Osório para o Camilo Pessanha.

Foi ela quem editou a 1.ª "Clepsydra".

Para além dos 2 geniais "bissextos" -fazem-me rir as volumosas "obras completas" de aviário,de poetas de hoje, que nem aos 50 chegaram, tijolos maçudos, que para aí se publicam...fica o poder maravilhoso e a capacidade de admiração da amizade sincera.

ppp

 
At 7:42 da tarde, Blogger hmbf said...

olhe ppp, e não é que estamos em total e absoluta concordância!!!!

 

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