24.2.06

POÉTICA

Estou farto do lirismo comedido
do lirismo comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente protocolo e manifestações de apreço ao Sr. diretor

Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo

Abaixo os puristas

Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis

Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifílitico
De todo o lirismo que capitula ao que quer que seja fora de si mesmo.

De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante exemplar com cem modelos de cartas e as diferentes maneiras de agradar às mulheres, etc.

Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbedos
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare

- Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.

Manuel Bandeira
Manuel Bandeira nasceu no Recife no dia 19 de Abril de 1886. Crítico de arte, professor de letras, tradutor, cronista e poeta, publicou o seu primeiro livro em 1917: A cinza das horas, numa edição de 200 exemplares custeada pelo autor. Colaborou no Mês Modernista, série de trabalhos de modernistas publicado pelo jornal A Noite, em 1925. Escreveu crítica musical para a revista A Idéia Ilustrada e escreveu também sobre música para Ariel, de São Paulo. Em 1940 foi eleito para a Academia Brasileira de Letras. Começou a fazer crítica de artes plásticas em A Manhã, em 1941, no Rio de Janeiro. Foi ainda professor de literatura hispano-americana da Faculdade Nacional de Filosofia. Recebeu vários prémios pelo conjunto da sua obra poética. Morreu no dia 13 de Outubro de 1968. »

1 Comments:

At 5:10 da tarde, Blogger hmbf said...

Muito obrigado, alfinete.

 

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