25.4.08

INÉDITOS DE JORGE AGUIAR OLIVEIRA #37

P DE FACA E TACHO



O pregão é pobre,
o manjerico enfezado
e a quadra é frouxa.
A sardinha e o cansaço

vivem congelados
transando nas ruelas
da Mouraria. Amanhã,
desfila a Marcha

pela Avenida repleta
de saltimbancos
do contrato a prazo
e dos trolhas

do sofrimento avulso.
O xaile da varina e
o avental da Rosa
do Mercado da Ribeira

hão-de ir parar à vitrina
do museu, onde haverá
uma foto documental
da escama do peixe

com legenda para
nenhuma criança pensar
ser a unha duma pega
travesti perdida no banco

de trás dum automóvel
à beira Tejo. Na noite
das Marchas, foliões
entre os canteiros,

fingem ver os marchantes
com as dores no corno,
cotovelo e no cu, por
pichas safadas e vadias,

que fazem duma foda,
um tempo de namoro
e dizem ficar noivos
de Santo António.

Fios dental cheirosos
a bacalhau no nariz
do polícia à paisana
e duas pernas ponteiros

de relógio que não param
de atiçar a procura
duma presa. Desfilam
os asnos, trauteando

notas vazias, engolindo
sapos a mando chantagista
dum chefe e mastigam
pizzas & hambúrgueres

ao balcão mal cheiroso
da moldada miséria.
Também andam por ali,
para serem vistos

pelos que lhes dão um
empregozito e os do voto.
Até os que travam lutas
na defesa da truta

e da libelinha, desfilam
num telejornal em busca
de protagonismo para
ganharem o troféu: o tacho.

Fatigado por não esquecer
o remorso de não ter
apanhado a onda do teu
olhar cheio de desejo e

a rejeitei, levo as mãos
aos bolsos, aspiro
o perfume dos manjericos
e entro pelas ruelas

da Mouraria boémia
para declamar um poema
ao primeiro que venha
socar a minha solidão.

Jorge Aguiar Oliveira