16.5.08

INÉDITOS DE JORGE AGUIAR OLIVEIRA #46

VINGANÇAS & COBARDIAS



Aos dezanove anos calçou
os primeiros sapatos e rumou
para o sul, onde pela primeira vez
colocou as mãos numas ancas
masculinas com idade e a aparência
de seu pai. Aprendeu depressa que
um enrabanço pode render camisas
de seda, perfumes, pulseiras e apostas
no Casino Estoril. A raiva provocou
a vingança das chicotadas ainda doendo
do rude progenitor. Tudo na vida
chegou tarde demais e a más horas.
O prato farto, carícias, o remorso.

E quando olhava pela vidraça da suite
via do pouco do mundo à sua frente
a saudade da sua terra voando dali
para os lugares de sonho e tristeza
de menino. Puxava a persiana
para baixo, suspirando uma aflição
no centro do tornado em que vivia.

A Clarinda que deixou à janela
do armário na serra, com a promessa
de um dia voltar para casar, fora violada
aos nove anos pelo pai e abusada
pelo tio, irmão do pai, num acordo
de cavalheiros selado entre cervejas
e uma jogada de copa. Um atrás
do outro, ameaçando contra a vida
protegendo o segredo fechado a
sete chaves, entre os três.

Anos mais tarde abateu a mãe
como uma porca, cravando-lhe uma
facada no pescoço, por esta desde
sempre tudo saber e nada ter feito.

Com trinta e oito anos, palitando
os dentes, conta já se ter deitado
com mil homens para esquecer
que algum dia teve pai.

E quando olhava pela vidraça...

um vazio inundava-o de tristeza.

Jorge Aguiar Oliveira