23.7.08

O pensamento nas mãos #13


Para a Inês Lourenço




Horowitz a tocar as Cenas de infância Op.15 de Schumann

Que sugeriu esta peça interpretada precisamente por Horowitz. As “Cenas de Infância” foram compostas em 1838, ao mesmo tempo que as “Kreileriana”. Segundo Michel Schneider, a música escrita por Schumann nesta época eram cartas secretas enviadas a Clara Wieck, o seu amor e também a primeira pianista mulher célebre no seu tempo. Assim, deixo aqui também as palavras do próprio Schumann, endereçadas a Clara:
“Eu descobri que nada me aguça a imaginação como escutar e languescer-me de qualquer coisa. É o caso dos últimos dias. Eu escutei a tua carta, e por consequência compus um volume de coisas loucas, maravilhosas e solenes. Quando tu as tocares vais arregalar os olhos. De facto, existem momentos onde eu rebento música. Mas, antes que me esqueça, deixa-me dizer-te que compus outra coisa. Talvez seja um eco do que me disseste uma vez, que ‘por vezes te parecesse uma criança’. Por isso, fiquei subitamente cheio de inspiração e escrevi uma trintena de pequenas peças donde extrai doze e chamei-lhes ‘Cenas de Infância’.”

In Michel Schneider, Musiques de Nuit, Edition Odile Jacob, Paris 2001, p-39

Maria João

7 Comments:

At 2:49 da tarde, Blogger hmbf said...

E porque ando com as mãos em e-mails antigos, julgo que a Maria João não me levará a mal se partilhar convosco parte de dois dos primeiros e-mails que trocámos depois de eu a ter convidado a colaborar no espaço insone:

Deu-me para aqui um entusiasmo e comecei a organizar textos em três blocos: Cenas de Infância, em homenagem a Schumann, ARteoRIA, pequenos ensaios a brincar e Fragmentos, coisa mais séria. Gostava que começasses nas Cenas de Infância, o resto alterna como te apetecer.
(…)
Começa com a Cena de Infância Op.1 e alterna-as também com as outras coisas, porque as Cenas de Infância irão terminar no Op. 15, as de Schumann. Acho que isto vai ser mesmo divertido.


Eu acho que tem sido.

 
At 2:59 da tarde, Blogger MJLF said...

epá, eu já não tenho esses emails, por causa dos problemas que tive com a antiga morada no sapo - uma virose- e também porque deixei de usar o outlook,apagou-se tudo com uma das avarias no computador, é giro, tens para ai isso guardado?
Isto é mesmo divertido, parece coisa de putos!
Maria João

 
At 5:47 da tarde, Blogger Logros said...

Maria João,

Obrigada pela gentileza e bom gosto.
Retribuo com dois poemas,publicados no livro "Os Solistas",1994, na Limiar e re-publicados numa antologia da Quasi, em 2000.

OS SOLISTAS

Cintilam suspensos dos dedos
os archeiros do som, enviados
do pulso e do sopro
aos caminhos invioláveis. Vão
no poder volátil dos ares,
orfeus absortos, apolos migrantes,
rostos de lebre possuída
pelo genocídio dos instantes.


GLEN GOULD


Procuras o som, a morte de ti mesmo,
centro do teu corpo a percussão que sonhas
límpida,
respiras como as cordas vibram
nessa invenção de vozes
mutuamente perseguidora.


Célere e luminoso expulsas da pauta
os ornatos falsos, os amantes fáceis,
desapossado estás de ti e possuído
pela audível construção, impossivelmente perfeita:
Steinway Glenn, Glenn Steinway, só para Bach.




Só uma pequena nota para dizer que este livro "Os Solistas" (1994) foi dedicado aos meus filhos, Nuno e Sofia, tendo esta muito novinha tocado, por diversas vezes, em público, as "Cenas Infantis".
Ao contrário do que diz a Rebelo Pinto, até há coincidências.

Abraço a todos os melómanos e "poetómanos" que por aqui passam, incluindo o Dom Henrique, não o da ponta de Sagres, mas do Insónia.


I. L.

 
At 11:45 da tarde, Anonymous Anónimo said...

As "Cenas Infantis" op.15 são de facto "recordações para as pessoas crescidas", pois trata-se uma obra tardia de Schumann, a parafrasear a sua própria infância (como diz o texto...).
De todas, a que sempre gostei mais de tocar e interpretar é a nr.13 "Fala o Poeta".
É única e especial.

Sofia

 
At 1:13 da manhã, Blogger MJLF said...

Inês: muito obrigada pelos poemas.

Sofia: Cenas infantis ou Cenas de infância, qual é a tradução mais correcta? Pois, coisas de crescidos. A nº13, fala o poeta, pelos vistos foi um remate após a carta que aqui traduzi, que estava no livro do Michel Schneider :)
Este autor diz que em Bach o piano pensa, em Chopin canta e em Schumann fala, mas fala uma língua estranha, como se fosse a voz do inconsciente.
Maria João

 
At 6:53 da tarde, Blogger Logros said...

Verifiquei que falta um "N" no título do poema "Glenn Gould". Peço desculpa do lapso.
Quanto ao facto inegável e conhecido, de que as "Cenas Infantis" são para gente crescida e uma obra tardia do Schumann, o certo é que a prof. de piano da Sofia, lhas ensinou aos 14 ou 15 anos, certamente porque encontrou na aluna desenvolvimento pianístico para tal.
Como simples melómana, suponho que as questões de maturidade interpretativa, vêm mais tarde.
Enquanto simples leitores - coisa um pouco dissemelhante, mas que também implica maturidade "interpretativa" - não lemos os grandes poetas e ficcionistas da mesma maneira, aos 15, aos 30 ou aos 50 anos.

Abraço

I. L.

 
At 10:02 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Maria João,

desde que estudei e toquei em público a obra, (efectivamente aos 13-14 anos) que sempre se chamou "Cenas Infantis" - é aliás o título que Vianna da Motta põe na sua edição de 1925, pela qual eu também estudei inicialmente.
O título original é "Kinderszenen", que no fundo pode ser traduzido de ambas as formas, "Cenas Infantis" ou "Cenas da Infância".
A questão de se são "Para a Infância" ou "Sobre a Infância" é uma matéria complexa, pois Schumann também escreveu o "Album da Juventude", esse sim destinado a servir de estudo aos jovens estudantes.

Sofia

 

Enviar um comentário

<< Home